África do Sul – Garden Route
Quanto mais a gente viaja, menos imprevistos acontecem. Verdade?
Não. Está aí uma mentira gigantesca. Desde que começamos a viajar, isso há uns oito anos, adquirimos bastante experiência com os perrengues e, sem dúvida alguma, lidar com eles ficou mais fácil. Mas eles sempre estão lá…
No dia 24/03/2018, por volta do meio dia, passamos pelos momentos mais tensos da viagem. Nossa programação para este dia, depois de toda nossas aventuras no Kruger Park, era fazer o deslocamento aéreo de Joanesburgo para Port Elizabeth, pela companhia Mango. E de lá seguir de carro pela Garden Route até Cape Town.
Após devolvermos o carro em Joanesburgo, chegamos ao balcão para o check in e, a pedido da atendente, colocamos uma das malas na esteira/balança. Enquanto entregávamos os documentos para conferência, ela acionou a esteira para que colocássemos a segunda mala.
Até aí tudo normal. Mas quando fomos colocar nossa segunda mala na esteira, percebemos que, ao invés de simplesmente afastar um pouco a primeira, a mala havia sido mandada diretamente para a esteira geral do aeroporto, SEM A ETIQUETA DE IDENTIFICAÇÃO!
Até agora não sei o que deu na cabeça daquela criatura, mas o fato é que ela sequer havia percebido que havia acabado de sumir com uma das malas. Como percebemos praticamente na hora e havíamos chegado com muita antecedência para o embarque, mobilizamos metade do aeroporto para que alguém tentasse localizar a tal mala e colasse a etiqueta.
No momento do embarque, ainda não tínhamos recebido notícia sobre o êxito dessa missão, mas na hora em que estávamos entrando no avião fomos informados de que a mala havia sido etiquetada e já estava dentro da aeronave. Quis muito acreditar nisso, mas algo ainda me dizia que nossa querida mala não estava no avião.
Dito e feito. Chegamos em Port Elizabeth e nada da mala. Fomos até o balcão da companhia e fizemos a reclamação. A atendente, visivelmente consternada com a situação, tentou nos acalmar e ligou no aeroporto de Joanesburgo para verificar se havia alguma informação.
Alguns minutos depois, quando estávamos terminando de preencher o formulário de bagagem perdida, ela recebeu uma ligação de Joanesburgo informando que a mala havia sido encontrada, mas só seria despachada no dia seguinte.
A essa altura não tínhamos certeza nem de que a mala havia sido, de fato, encontrada, muito menos que seria despachada no outro dia. Mesmo assim, vida que segue. Não tínhamos tempo para ficar chorando pela mala perdida.
Fomos até a Europcar no aeroporto, pegamos o carro que havíamos reservado e seguimos até o Hotel Paxton. Estávamos cansados, com fome e preocupados. Acionamos o seguro que havíamos feito, mas não serviu para absolutamente nada, porque a empresa aérea não emitiu o formulário de extravio seguindo o padrão internacional, com um código de rastreamento.
Então, como única saída em um momento como este, fomos até uma cervejaria fazer degustação de cervejas e comer hambúrguer.
A cervejaria se chama Beershack e é uma delícia. O lugar é bem pitoresco, aconchegante e moderno ao mesmo tempo e super descontraído. As cervejas estavam ótimas e a comida também. Saímos de lá, demos uma voltinha rápida pelos arredores e voltamos para o Hotel.
A noite demorou uma vida para passar. No outro dia acordamos cedo e antes mesmo de tomar café da manhã, fomos ao aeroporto. Aguardamos até o voo vindo de Joanesburgo chegar e, enfim, quando as bagagens foram colocadas na esteira, avistei nossa amada mala. Me senti correndo em câmera lenta para abraça-la. Esse reencontro foi muito feliz e emocionante.
Passado o perrengue, continuamos com nossos planos, pulando os passeios por Port Elizabeth, que foram prejudicados por termos tido que voltar ao aeroporto.
Os planos consistiam em dirigir até Cape Town, passando pela região conhecida como Garden Route, que tem esse nome justamente em razão das belas paisagens no caminho, muitas delas dentro de parques nacionais.
Saímos de Port Elizabeh e fomos seguindo pela Garden Route até Jefreys Bay, onde tomamos café em uma das filiais do Mugg & Beans. Essa unidade em especial era bem bonita e estava com o clima bem gostoso. Era domingo de manhã e o dia estava lindo.
Fizemos nosso lanche e saímos com destino ao Parque Tsitsikamma, parando em uma ponte bem interessante no caminho.
Chegamos no Parque por volta das 13 horas, pagamos a entrada (uma das mais caras da viagem) e fomos até o local onde as trilhas mais conhecidas começam. O parque é lindo e, como quase todos os outros do país, é administrado pela Sanparks.
Existem duas trilhas mais conhecidas. Uma delas sai de uma área perto das cabanas e vai até uma cachoeira que deságua no mar. Essa Trilha é conhecida como Waterfall e possui dificuldade média, na minha opinião.
O caminho é bem sinalizado, mas tem diversas áreas em que a trilha é sobre as pedras e isso torna um pouco perigoso o percurso. Nada que torne impossível, mas acaba exigindo um pouco mais de atenção.
Demoramos cerca de três horas para fazer o trajeto de ida e volta, que deve dar aproximadamente seis quilômetros. Sofri um pouco com calos e machucados nos pés, pois em razão do problema com a mala, havia saído de manhã sem meias compatíveis com as botas. Nada que um curativo não tenha resolvido. Fiquei me lembrando do Fellipe: “cicatrizes são troféus”.
Terminamos essa trilha e fomos fazer a outra, chamada Storms River Mouth, que conta com belas paisagens, pontes suspensas e o encontro do Storms River com o Oceano Índico. Caminhadinha bem fácil, cerca de três quilômetros no total. Peace of cake.
Tivemos sorte de fazer esse passeio bem no final da tarde, então a luz estava deslumbrante.
Saímos do parque à noitinha e seguimos para Plattenberg Bay, onde havíamos reservado um quarto em uma guest house chamada Long History.
O local era muito bem avaliado, mas mesmo assim ficamos receosos quando percebemos que não ficava no centro da cidade. Na verdade, a pousada fica na parte mais baixa da cidade e, à noite, o lugar parecia meio deserto demais.
Felizmente essa impressão durou apenas alguns minutos. Assim que a Meg, dona da pousada, nos recebeu, percebemos que havíamos feito uma escolha maravilhosa. Ela, acompanhada de sua cachorrinha linda, nos mostrou a pousada e deu dicas a respeito de locais para jantar e passeios pela região.
Tomamos banho e saímos para jantar no Fat Fish, que ela havia indicado. O restaurante é lindo, a comida e o vinho maravilhosos. Não poderíamos ter terminado a noite melhor. Depois de algumas horas de risadas e conversas, voltamos para o hotel e, enfim, descansamos.
No outro dia acordamos cedo e fomos até a cozinha da pousada, onde alguns funcionários nos aguardavam para o café. Nos sentamos em uma mesa ao lado da piscina e desfrutamos de um café perfeito. Frutas, grãos, bebidas, pães e panquecas. Tudo caprichado, delicioso e fresquinho.
Terminada a refeição, depois do Fellipe brincar com o cachorro e tentar explicar para Meg como é a região em que moramos, nos despedidos dela como quem diz adeus a um amigo, e saímos com destino ao Parque Robberg, que fica bem pertinho da cidade.
Pagamos cerca de R$20,00 de entrada e fomos fazer uma das trilhas disponíveis. Escolhemos a trilha intermediária, já que não tínhamos muito tempo. A trilha é linda e leva a lugares impressionantes. O sol estava bem quente e a trilha é toda a céu aberto, então é bom usar protetor solar e alguma proteção para a cabeça.
Alguns estudantes também estavam fazendo a trilha e acabamos cruzando com eles durante todo o percurso. Achei que isso seria um entrave para o passeio, mas me rendeu um dos momentos mais emblemáticos da viagem.
Desde o momento em que cheguei em Joanesburgo, minha percepção sobre a brutalidade das divisões raciais havia mudado radicalmente. Uma coisa é ler, ouvir falar. Outra, bem diferente, é ver, sentir essa divisão…
Eu estava olhando as crianças fazendo peraltices, se jogando dunas abaixo e rolando na areia, quando percebi que a quantidade de negros e brancos era praticamente a mesma e que entre eles não parecia haver qualquer tipo de distinção. Eram apenas crianças. Simplesmente isso.
Pode parecer clichê, e talvez seja mesmo, mas diante disso foi impossível não lembrar de Nelson Mandela: “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, ou por sua origem, ou sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se elas aprendem a odiar, podem ser ensinadas a amar, pois o amor chega mais naturalmente ao coração humano do que o seu oposto. A bondade humana é uma chama que pode ser oculta, jamais extinta.”
Após o passeio, fomos para Knysna, onde subimos até um mirante com uma vista incrível.
Ficamos lá alguns minutos, descemos e fomos almoçar no famoso East Head. Tinha fila de espera, não era barato e nem era tão bom assim. Mas para chegar a essa conclusão tínhamos que experimentar.
Enquanto esperávamos uma mesa, fomos até a praia que havíamos visto lá de cima do mirante.
Terminamos o almoço e seguimos para Swelledan, já nos afastando da Rota Panorâmica e começando nossa jornada pela região dos vinhos.
Swelledan é uma cidadezinha de origem holandesa, bem pequena, literalmente aos pés de uma impressionante cadeia de montanhas. Chegamos lá com o sol se pondo e fomos direto para a pousada Aan de Oever, que é uma graça.
Saímos para jantar e, por indicação e com reservas feitas por uma das funcionárias da pousada, fomos ao Drasty. Confesso que gostei mais do ambiente que da comida, mas ainda assim valeu muito a pena. Fomos e voltamos a pé, observando a simpática vizinhança.
No outro dia, acordamos cedinho e tomamos café da manha na área externa da pousada, olhando para as montanhas. Em seguida, arrumamos as coisas e saímos com destino a Stellenbosch.
Para quem curte vinho, passear pela região das vinícolas é imperdível. Até as estradas são lindas. Nessa região existem duas cidades que abrigam a maio parte das vinícolas: Stellenbosch e Franschhoek. Optamos por ficar nas proximidades da primeira.
Chegamos ao nosso primeiro destino, Jordan Wine State, por volta das 12h30. Não havíamos feito reserva, mas, ainda assim, não tivemos problema em conseguir uma mesa para o almoço. Escolhemos uma opção de almoço com três pratos, mas optamos por não fazer a degustação de vinho porque ainda seria preciso dirigir até outra vinícola.
O almoço estava uma delícia e o lugar é realmente fantástico. Ficamos por lá por algumas horas e saímos com destino à Spier Wine Farm, onde iríamos nos hospedar. Aqui uma dica: vale muito a pena escolher um hotel dentro de uma vinícola. Assim dá para aproveitar melhor o lugar, sem preocupações com a “lei seca”.
Posso dizer que, apesar de termos ficado apenas uma noite por lá, aproveitamos bastante. Assim que chegamos fomos recebidos com uma taça de vinho. Fizemos o check in e logo depois nos levaram para a área dos quartos, organizados em charmosas vilas, em um divertido carrinho de golf.
Após deixarmos as malas no quarto, fomos fazer uma caminhada pelo local. Na recepção, havíamos pegado um panfleto com instruções de utilização de um aplicativo de áudio guia para um passeio pela propriedade da vinícola, no qual já ficamos logo interessados.
O passeio foi bem divertido e tomou todo o nosso restinho de tarde, passando pelas construções históricas da empresa, fundada em 1692, e por jardins e campos com lindas vistas das montanhas.
Na volta para a vila onde ficam os quartos, passamos na recepção e pedimos para reservar uma mesa para o jantar. A vinícola tem dois restaurantes. Um deles, mais moderno, é o Eight. O outro é da própria vinícola. Escolhemos o segundo porque era praticamente ao lado da vila onde estávamos hospedados. Tivemos uma refeição maravilhosa, com um vinho tinto delicioso.
No outro dia, logo depois do excelente café, fechamos a conta no hotel e fomos embora, dessa vez com destino à Cidade do Cabo. Nosso dia estava repleto de atrações, começando pela Praia chamada Muizemberg, que conta com vestiários coloridos bem fotogênicos.
De lá fomos para a Bolders Penguim Colony, um santuário que presta cuidado aos simpáticos bichinhos. Passeamos pelas passarelas em volta da reserva e vimos tantos pinguins que desistimos de pagar para entrar.
Saímos de lá e, nos despedindo da Garden Route, fomos até o parque onde está localizado o Cabo da Boa Esperança e o Cape Point.
Chegamos lá por volta das 13 horas, então fomos direto almoçar. Escolhemos o restaurante Two Oceans. Não era dos mais baratos, mas acho que valeu à pena. A comida estava ótima e a vista é absurda.
Depois do almoço fizemos uma curta caminhada até o farol e, de carro, fomos até o Cabo da Boa Esperança. Ficamos por lá por alguns minutos e, como o tempo indicava que uma chuva estava iminente, decidimos continuar nosso percurso.
No retorno para a estrada que possibilita a saída do parque fomos interceptados por babuínos, sendo que um deles chegou a subir em nosso carro. Passado o susto, continuamos nosso trajeto até Cape Town, onde chegamos à noite, sob uma chuvinha gelada.