A exuberância de Ronda

Quando estávamos traçando nosso roteiro pelo sul da Espanha, de plano, a cidade de Ronda atravessou meu caminho e se fixou como uma parada inegociável. Sonhadora que sou, vi nas descrições que li, um lugar além da imaginação.

De fato, Ronda era tudo o que imaginei e muito mais. Passei dias a fio tentando encontrar as palavras certas para este post. Tantas foram usadas nos anteriores, tantas ainda guardadas (esperando o momento aparecer) e nenhuma delas parece ser suficiente para esta missão.

Tão vasta é a experiência de ver Ronda ao vivo, que as palavras parecem ser extremamente limitadoras. O fato é que Ronda não cabe nas minhas palavras e olha que, para mim, palavras sempre foram gigantes.

Bem por isso, peço licença para usar a descrição feita pelo escritor austríaco Rainer Maria Rilke, que viveu em Ronda por muitos anos:

“Tenho procurado em todos os lugares pela cidade dos meus sonhos e finalmente encontrei-a em Ronda. O espetáculo desta cidade… separada pelo estreito, profundo desfiladeiro do rio, corresponde à imagem daquela cidade revelada em meus sonhos”.

Mesmo com essa dificuldade, que talvez fique clara no decorrer do texto, prometo ser fiel ao juramento de blogueira de viagem: a partir de agora, da forma mais verdadeira possível, vocês vão conhecer Ronda através do meu olhar.

Chegamos a Ronda no fim da tarde, quando o sol se avermelhava e pintava de cobre as montanhas que cercam a cidade. Ao invés de começar o passeio pela entrada histórica da cidadela, a Puerta de Almócabar, acabamos indo por fora da cidade até o hotel que havíamos reservado, o Catalônia Reina Victória.

Como algumas das ruas da cidade são bem estreitas, isso acabou facilitando bastante a nossa vida, pois chegamos de carro tranquilamente até o hotel. Rapidamente fizemos os procedimentos de check in e, com o carro guardado no estacionamento, ficamos livres para passear sem maiores preocupações. No check in conseguimos um quarto com vista. E que vista….

Como o hotel tem belos jardins e uma vista absolutamente incrível, começamos nosso passeio por ali mesmo. De lá, já fomos descendo pelas simpáticas ruas até chegar à Iglesia de Nuestra Senora de la Merced de Ronda. Seguimos até o parque Alameda del Tajo, que tem um agradável espaço para caminhadas, rodeado de belas árvores outonais.

Do parque, fomos até o Paseo De Los Ingleses, uma espécie de caminho construído literalmente na beira do desfiladeiro, que conta com diversos miradores. Não fizemos todo o percurso do Paseo, apenas a parte que fica mais perto do parque, mas ele é bem grande e permite visões muito bonitas do penhasco e das montanhas.

Aliás, palavras como abismo, penhasco e desfiladeiro são parte da descrição de Ronda. Isto porque a cidade é cortada pelo rio Guadalevín, que, com o passar dos anos (muitos anos), foi esculpindo um profundo caminho por entre as rochas, o que chamam de Tajo.

O Tajo de Ronda é tão impressionante que muitas obras literárias fazem menção direta ou indireta a ele. Aliás, não apenas o Tajo causa fascínio, mas a cidade como um todo.

Tamanha é a inspiração causada, que o cenário do livro Por Quem os Sinos Dobram, do escritor Ernest Hemingway é a própria cidade de Ronda e o Tajo que a corta ao meio. O escritor Rainer Maria Rilke, que eu citei ali em cima, escreveu as Elegias de Duíno, um dos exemplos mais marcantes do lirismo no século 20, enquanto estava na cidade. Aliás, no hotel em que nos hospedamos há uma estátua em homenagem a ele, olhando para o horizonte.

Bom, referências literárias feitas, voltemos ao nosso passeio. Seguimos pelo Paseo De Los Ingleses até o Mirador de Ronda, uma espécie de coreto, que reflete de forma muito genuína o natural romantismo de Ronda. Apesar da linda vista que se tem do mirador, seguindo um pouco mais a frente é que se tem uma das imagens mais fotogênicas da cidade. No pôr do sol, a silhueta do coreto contrasta perfeitamente com o fundo dourado da montanhas.

Então, seguimos pelo caminho que contorna o Parador de Ronda até nossa primeira vista da emblemática Puente Nueva. Essa ponte é o principal cartão postal de Ronda e é a mais impactante dentre as três que atravessam o rio ligando os pontos da cidade.

Inicialmente, nossa ideia era apenas dar uma espiadinha na ponte. No entanto, a empolgação era tanta que, mesmo cansados, atravessamos a ponte e fomos andando até a Plaza Maria Auxiliadora, de onde descemos uma trilha até o Mirador Puente Nueva de Ronda.

Já era noite. Mas isso não nos desanimou, pois a trilha é calçada e até bem iluminada. Sem dúvida a vista compensa muito a caminhada, principalmente porque a ponte iluminada é uma coisa de outro mundo. Aquele momento, de olhar para a imensidão do desfiladeiro e ver as luzes das casas e construções iluminando o penhasco, é indescritível. Ficamos algum tempo por lá e, depois, subimos de volta para a cidade.

Fomos, então, até a Plaza España, onde estava havendo uma cerimônia para o início oficial dos festejos natalinos. Havia música, luzes coloridas e uma emoção perceptível entre todos que estavam presentes: era a primeira vez, depois do início da pandemia, que as pessoas se encontravam oficialmente para as festividades natalinas. As músicas entoadas pelo coral ecoavam pela cidade toda e foram nos acompanhando pelos nossos passeios. A cidade já é espetacular, com trilha sonora e luzes coloridas então, é mesmo inesquecível.

As ruas estavam bem cheias e animadas. Ficamos um bom tempo andando pela Calle Carrera Espinel, que conta com muitas lojas bacanas. Depois, já cansados de tanto andar, paramos para jantar na pizzaria Vesubio, que descobrimos meio ao acaso. Pedimos pizza e calzone e ambos estavam muito bons. Depois do jantar, voltamos para o hotel e fomos descansar.

No dia seguinte, aproveitamos o maravilhoso café da manhã do hotel e saímos para ver (e revisitar) alguns pontos na cidade. Atravessamos a Ponte Nova e fomos até o Mirador Del Aldehuela, cujo nome é homenagem ao engenheiro que coordenou as últimas etapas de construção da ponte. À partir do mirador, além da óbvia vista da Puente Nuevo, é possível ter uma bela vista da Puenta Vieja e dos Jardines de Cuenca.

Aliás, nosso planejamento incluía descer até os jardins e, de lá, tirar algumas fotos da ponte. No entanto, acabamos mudando de ideia, pois a vista dos jardins à partir do mirador era perfeita e, do jardim, a vista da ponte e da cidade seria contra o sol naquele horário, prejudicando as fotos.

Andamos um pouco pelo casco antigo, passamos pelo Mirador Viajeros Romanticos e fomos até a Puerta Carlos V, bem ao lado da Puente Vieja, mais antiga (como se pode deduzir) e mais simples que a nova.

De lá, seguimos até a Iglesia de Santa Maria La Mayor. A Igreja é bem grande e parece ter um belo interior, mas não chegamos a entrar. De toda forma, a fachada e a torre já impressionam.

Após algum tempo andando, voltamos ao hotel, fizemos o check out e fomos, de carro, até a parte mais baixa da cidade. Demos algumas voltinhas pela região e seguimos até o Mirador La Hoya Del Tajo, de onde é possível ter uma vista mais ampla da ponte, do penhasco e da tímida cachoeira que parece brotar entre as pedras.

Ficamos algum tempo no local, admirando a paisagem, tirando fotos e já nos preparando para mais uma despedida. Infelizmente, nosso roteiro não permitia muitos ajustes, então tivemos que dizer adeus e seguir viagem, já que nosso próximo destino estava a mais de cem quilômetros.

Nosso tempo por Ronda mostrou que, mais que uma lista de lugares a visitar, a cidade se oferece ao visitante como obra prima em si mesma. Passear pelas ruas e se deixar imergir pela energia contagiante da cidade é que faz deste destino uma experiência única.

Ronda surgiu de modo avassalador na nossa viagem e, certamente, merecia mais tempo. É um lugar como poucos, que pede para ser apreciado em todos os ricos detalhes. É misterioso e ao mesmo tempo acolhedor. Das construções esplendorosas à magia do Tajo, nada é usual em Ronda. Tudo é impactante, surpreendente, mágico e encantador.

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