Os Caminhos de Bento Gonçalves

A região onde está localizada a cidade de Bento Gonçalves é muito procurada por quem gosta de vinhos, já que é o principal ponto de partida para o Vale dos Vinhedos. Mas se engana quem pensa que a região é apenas isso. O Vale dos Vinhedos, que engloba parte das cidades de Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul, vai muito além dos parreirais.

Não bastasse a culinária maravilhosa, baseada predominantemente na gastronomia italiana, a região abriga lindas paisagens, uma história de imigração muito valiosa e construções  antigas muito bem preservadas. Isso sem contar a mágica de se perder (e se encontrar) nos caminhos que rodeiam as cidades e vilas espalhados ao longo da serra. 

Por falar em caminho, a primeira parte do nosso roteiro por Bento Gonçalves não foi o Vale dos Vinhedos, mas a encantadora região dos Caminhos de Pedra. Aliás, até nos hospedamos lá para conseguir aproveitar melhor o lugar.

Mas antes de falar disso, vamos à nossa chegada à Bento Gonçalves. Saímos de Cambará pela manhã e seguimos até a cidade de Farroupilha. Fizemos uma breve parada para almoço e seguimos viagem para Bento, onde chegamos no meio da tarde.

Não havíamos planejado muita coisa para a cidade em si, principalmente porque as estrelas na nossa viagem eram as paisagens bucólicas e não urbanas. De toda forma, demos uma paradinha no Pórtico da cidade, em formato de pipa. Aproveitamos para pegar alguns mapas no centro de informações turísticas e seguimos para a Vinícola Aurora.

Já conhecíamos o lugar, mas achamos interessante fazer uma nova visita, até para explicar melhor aqui no blog. A Aurora é uma cooperativa muito importante para a região e, apesar de não ter o charme de uma vinícola mais requintada, merece a visita. Aliás, as visitas são gratuitas e ocorrem praticamente durante todo o dia, sem necessidade de prévio agendamento. Nós chegamos e, depois de uns 15 minutos, já estávamos fazendo o tour guiado pelo local.

No passeio, é possível conhecer mais sobre a produção de vinhos em si e sobre a história da empresa, além de ver de perto os imensos tonéis (que são chamados de pipas) onde são armazenados os vinhos e sucos de uva durante a produção. A visita é encerrada com uma degustação e, no dia em que fomos, além dos vinhos e sucos, também foi possível degustar um azeite, que era muito bom, diga-se de passagem.

Terminada a visita, seguimos até a Pousada Cantelli, escolhida pela localização privilegiada e por ser uma construção histórica, feita por imigrantes italianos em 1878. Se é para viajar no tempo e viver a história da imigração italiana em Bento, nada melhor que se hospedar em uma autêntica casa de Pedra.

Para quem acompanha o blog há algum tempo, já deve ter ficado claro que tenho um amor surreal pela cultura italiana. Sou totalmente apaixonada pela comida, pela língua (apesar de ainda não conseguir completar mais que uma ou duas frases) e pelos trejeitos todos, inclusive os estereótipos.

Justamente por isso, me lembro com detalhes sobre a primeira vez que estive no Caminhos de Pedra. Fiquei encantada com a história de cada uma das construções e, especialmente, com a identificação em relação à vida dos imigrantes. A cada objeto eu via um pouco da história da minha família e isso foi construindo em mim um senso de pertencimento que eu nem sabia que tinha.

Enfim, visitar esse lugar era algo muito desejado. Ao mesmo tempo que havia a expectativa de passear por lá novamente, havia o receio de não ser tudo aquilo que lembrava. Muitos anos haviam se passado e muitos outros lugares haviam sido vistos desde então. Será que essa revisitação seria mesmo o que eu esperava?

Não sei se ando mais emotiva que o normal, mas nossos dias pelo Caminhos de Pedra foram maravilhosos. Calmos, brilhantes, suaves e inesquecíveis. Cheios de memórias afetivas e descobertas incríveis.

Para quem está se perguntando o que são esses tais caminhos, posso tentar explicar. Há uma região bem pertinho da cidade de Bento Gonçalves que abriga uma dezena de construções antigas, da época da imigração italiana, por volta de 1875. Muitas delas estão dispostas ao longo de um caminho, daí o nome do lugar, mas a região inteira é uma aula de história, dessas apaixonantes, que te levam para outra época num piscar de olhos.

A parte mais clássica do passeio é composta por diversas casas, hoje voltadas ao turismo, que se espalham por um caminho de uns 15 km. Existem mapas da região onde os pontos estão bem detalhados, o que ajuda muito na hora de montar um roteiro.

Nós não visitamos todas as casas, pois são muitas e algumas estavam fora do nosso leque de interesses. Depois de avaliar bem as opções, fomos até a Casa da Ovelha, Casa do Tomate, Casa da Cuca, Casa das Massas e Casa da Erva Mate.

Em geral as pessoas deixam um dia para fazer esse passeio, muitas vezes saindo de manhã de Bento e retornando à tarde. Nós optamos por ficar um pouco mais de tempo para aproveitar com mais calma o que a região poderia nos oferecer e ter uma imersão mais autêntica.

Foi justamente pensando nisso que a Pousada Cantelli entrou no nosso roteiro. Mais que uma opção de hospedagem, a pousada é uma atração por si mesma. 

A casa principal, de pedra e madeira, foi construída pela família Cantelli e está muito bem preservada. Muito cuidado foi tomado para que sua transformação em uma pousada não apagasse as memórias do lugar. A cada canto que se olha é possível vislumbrar o carinho que tiveram para manter vivas as lembranças.

O quarto em que ficamos era a cozinha da casa, de modo que o guarda-comidas está na parede, com as imperfeições e “engenharias” da época.

Mas não se enganem. Apesar da fidelidade à construção original, a pousada é extremamente confortável. Mais que isso, as áreas comuns são novas, modernas e muito bem cuidadas.

O restaurante da pousada é uma coisa de outro mundo. Jantamos por lá nas duas noites em que ficamos hospedados e foi maravilhoso. Uma comida excelente e um carinho perceptível em todos os detalhes. O mesmo foi visto no café da manhã, trazido à mesa de modo impecável.

Só pela pousada nossa visita aos Caminhos de Pedra já teria valido à pena, mas não foi apenas isso que tornou nossos dias especiais.

Assim que fizemos check in na pousada, deixamos nossas coisas e fomos passear. Seguindo as dicas das recepcionistas da pousada, fomos até o Benevento Chocolate e Café. O local é novo e muito bonito. Conta com um amplo jardim e um café bastante agradável.

Infelizmente, achei que o chocolate deixou a desejar. Sou bastante criteriosa com chocolate e, apesar da beleza da apresentação, os pralinés e demais produtos não me convenceram. Fellipe fez um lanchinho no local, um sanduíche com queijos e figo, mas eu achei uma combinação doce demais. Enfim, o lugar é lindo e vale uma visita, nem que seja apenas para apreciar a paisagem.

Voltamos para a pousada e fomos descansar um pouco. Jantamos por lá mesmo e, obviamente, foi uma delícia. Começamos com uma salada com folhas, queijo, prosciutto e tomates confitados, regada com um azeite espetacular. Tenho certeza que agradaria até quem torce o nariz para os verdinhos.

Como prato principal eu pedi uma massa recheada, com um molho branco amanteigado. Estava muito suave e saboroso.

Encerramos o jantar e voltamos para o quarto. Para nossa surpresa, sobre a mesinha de cabeceira havia docinhos e flores de lavanda, com um simpático desejo de boa noite. É ou não é para ficar encantado?

No outro dia continuamos sendo mimados, desta vez com um delicioso café da manhã. Foi a forma perfeita de começar as tarefas do dia, que incluíam alguns passeios por vinículas na região de Pinto Bandeira. Aliás, uma coisa muito bacana de se hospedar na região do Caminhos de Pedra, é poder aproveitar e passear pelas vinícolas de Pinto Bandeira, que são muito charmosas e fogem daquele roteiro comum do Vale dos Vinhedos.

A primeira parada do dia foi a Vinícola Terraças. Fomos recepcionados e guiados pela dona, uma simpática e falante senhora, que, de modo bem informal, nos mostrou a linha de produção. É uma vinícola pequena, totalmente familiar, bem diferente de outras propostas comerciais que já conhecemos. Talvez por isso tenha sido uma visita deliciosa. A degustação foi bem simples, mas muito descontraída, com a enóloga pertinho para eventuais dúvidas.

Gostamos bastante da linha No Ar, mas o que mais me chamou a atenção foi o suco de uva branco que eles produzem, uma delícia. Gostamos tanto que trouxemos uma garrafa para casa, além de algumas garrafas de vinho.

Da Vinícola, é possível avistar a Cascata dos Amores, uma bela queda d’agua que há na região. Aliás, bem pertinho há um mirante para a cascata.

Saindo da Terraças, fomos até a vinícola Geisse, maior e mais tradicional, com foco na produção de espumantes. O lugar é muito bonito e conta com um restaurante muito acolhedor. Não fizemos a visita guiada, mas aproveitamos o restaurante para provar espumantes e algumas empanadas, que estavam deliciosas. 

Continuando nosso passeio, voltamos para a rota principal dos Caminhos de Pedra e demos início às visitas. Começamos pela Casa da Ovelha. No local há uma loja bem bonita, que vende doces, queijos e uma série de produtos relacionados às ovelhas. Também é possível fazer uma visita guiada pela propriedade, que é quase um parque temático. O passeio parece ser mais interessante para quem está com crianças, então, nos limitamos à visita à lojinha.

Saindo de lá, fomos até a casa das Massas. Provamos alguns biscoitos e doces e compramos algumas delícias. Na primeira vez que estivemos lá me lembro de ter comprado massas caseiras, mas, cozinheira que estou, as massas aqui de casa  atualmente são feitas por mim.

Deixamos a Casa das Massas e seguimos para a Casa da Tecelagem. Por lá, nossa parada foi bem rápida. Compramos algumas coisinhas e voltamos ao início do roteiro até a Casa do Tomate.

Na Casa do Tomate fizemos uma visita guiada. Foi um passeio interessante, embora já não fosse novidade. Tive a impressão que esse passeio continua igualzinho. Começamos com uma visita à casa, com móveis antigos e objetos que eram usados pela família. No fim, passamos pela loja, onde são vendidos molhos, compotas e tudo o mais.

Saindo da Casa do Tomate, era hora de fazer um lanchinho. Então, refizemos todo o trajeto principal dos Caminhos de Pedra até a Casa da Cuca. Provamos cuca de uva, acompanhada de chá e café. Estava tudo delicioso.

Bem ao lado da Casa da Cuca está a Casa da Erva Mate. Em nossa viagem anterior já havíamos feito a visita guiada para conhecer o processo de fabricação da erva mate, então optamos por não repetir essa parte do passeio. Mas indico bastante para quem tem curiosidade de saber um pouco mais sobre a típica bebida gaúcha, o chimarrão. No local, há ainda uma roda d’agua e um belo jardim, que convidam para uma pausa demorada.

Depois de algumas comprinhas na loja da Casa da Erva Mate, encerramos os passeios do dia visitando o Santuário de Caravaggio, um lugar lindo, que transmite muita paz e possibilita uma vista muito bonita da região. Para chegar até lá é bem simples: basta seguir adiante depois da Casa da Erva Mate, atravessar a rodovia e ir seguindo até a cidade de Caravaggio. Logo depois da rodovia já começam a surgir placas indicando o caminho, que é lindo, cheio de flores e menções ao Santuário.

No fim da tarde, voltamos para a pousada, onde ficamos admirando os detalhes da construção, adornados por floreiras, ainda mais bonitas sob a luz do sol. Mais uma vez, optamos por jantar por lá e não nos arrependemos. O jantar foi maravilhoso, assim como o vinho que tomamos.

No outro dia, já com saudade, dissemos adeus à pousada e aos Caminhos de Pedra, partindo para mais uma etapa da nossa jornada pelas terras gaúchas.

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1 Resultado

  1. Rosângela disse:

    Gosto de ler seus relatos. Embora eu não conheça o lugar em si, é possível viajar na leitura. Parabéns Ilcemara!

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